segunda-feira, 11 de março de 2013



Entrevista com Sergio Vaz, criador do Cooperifa
Repartir o pão da sabedoria
Foi com uma simples ideia e um sonho de propagar a literatura na sua comunidade, que Sergio Vaz criou o Sarau da Cooperifa, esse projeto ganhou corpo e quase 11 anos depois, leva seus versos a muitos outros lugares
Fernando Santos
Todo menino sonha em ser jogador de futebol, e com esse mineiro de 48 anos não foi diferente. Leitor assíduo graças ao pai que tinha a leitura como hábito, o jovem rapaz foi trocando aos poucos os campos de várzea pelas bibliotecas e a bola e pelos livros, mais nunca deixando de lado o esporte que é sua grande paixão.
Casado há mais 15 anos, pai de Mariana, Sergio Vaz recebeu a nossa revista em sua casa em Taboão da Serra extremo sul de São Paulo, numa segunda-feira ensolarada, para uma conversa bem descontraída. Com um grande sorriso no rosto, muito simpático, logo nos deixou muito a vontade. Nosso primeiro contado com o poeta havia sido uma semana antes no Sarau da Cooperifa, onde ele nos recebeu na porta e convidou toda a equipe para participar do Evento.
Como dizia o poeta “Para sobreviver o homem só precisa de alimento e sonhos”, é com esse intuito que todas quartas- feiras acontece no bar do Zé Batidão os Saraus da Cooperifa. Em um ambiente que mais parece uma garagem, algo em torno de 60 metros quadrados, umas quinze mesas de plásticos espalhadas pelo local, ao centro um pedestal com um microfone, e duas caixas de som uma de cada lado. Nesse recinto duas centenas de pessoas se aglomeram para assistir o evento, homens, mulheres, crianças, idoso, donas de casa, moradores de rua, enfim todos são bem vindos pra expressar, suas angustias, medos, tristezas e alegrias, não importando se tem rima, à plateia em silêncio acompanha as apresentações, numa verdadeira troca de experiência e cultura.

Revista- Sérgio fala um pouco de você, seus projetos e planos.
 Sérgio Vaz- Mano, eu sou um cara que tenho 48 anos, sou casado, tenho uma filha chamada Mariana, moro em Taboão da Serra, sou poeta, produtor cultural, e já escrevi sete livros.
Revista- Como foi o seu primeiro contato com os livros?
Sérgio Vaz- Eu gosto de ler desde cedo, por que meu pai gostava, aprendi com ele. Mas como todo garoto de periferia, eu queria ser jogador de futebol, não deu certo, nunca imaginei ser poeta, o trabalho da Cooperifa tem haver com isso, eu sempre pensei em fazer projetos, na verdade eu queria que meus amigos gostassem de ler como eu. Assim a gente criaria uma comunidade melhor.
Revista- A cooperifa surge dessa ideia?
Sérgio Vaz- A Cooperifa foi criada por mim e pelo Marco Pezão, e a ideia era basicamente propagar a literatura na periferia.
Revista- E não tinha ninguém que falasse de poesia na periferia?
Sérgio Vaz- Sempre teve gente falando de poesia na periferia, não fui eu que inventei isso. Não existia ninguém que tivesse espaço, para falar de literatura, a Cooperifa ao menos tinha sede, era em uma fábrica abandonada em Taboão da Serra.


Revista- Que fábrica que é essa?
Sérgio Vaz- Eu tinha um amigo que fazia silk screens {é arte de colar estampa em camisa} em uma fabrica em Taboão da Serra, um dia eu fui visitá-lo e vi o espaço e falei, Caramba! Dá para fazer um monte de coisa aqui. E eu estava lendo algo sobre a semana de arte moderna de 22 { foi um evento de arte que durou uma semana, e cada dia foi dedicado a um tema: pintura, escultura, poesia, literatura e música, esse evento ocorreu no Teatro Municipal} e foi com essa influência que a gente criou os primeiros eventos da Cooperifa.  Pena que logo perdemos o local.
Revista- Ai vocês chegaram ao bar do Zé Batidão?
Sérgio Vaz- Então o Pezão conseguiu um bar em Taboão mesmo, e a gente ficou fazendo os Saraus lá, só que um e meio depois perdemos o espaço também, aí eu falei para o Zé estamos mudando para cá, e já era!
Revista- Por que um bar?
Sergio Vaz- O bar é uma cultura da periferia, assim como pipa, bolinha de gude, tudo acontece lá, a reunião do time da várzea, é onde se guarda os instrumentos da escola de samba da quebrada, é onde se discute se vai asfalta a rua, é a central de encontros da comunidade, se você não for conhecido no buteco ninguém te acha.
Revista- Os saraus acontecem as quartas- feiras, que é dia de futebol, é um jeito de tentar desalienar as pessoas?
Sérgio Vaz- Não! No domingo é sagrado, sexta e sábado tem balada, quinta-feira já começa o esquenta, então quarta- feira é o dia. Não foi de propósito, mais só cola realmente quem gosta de poesia.
Revista- Que público vem prestigiar o evento?
Sérgio Vaz- O público é bem variado, qualquer pessoa que é ligada a cultura quer conhecer o sarau da Cooperifa. Aqui a gente tem um movimento de resistência, um evento que já acontece há onze anos, sem música ou apoio do governo. Ali a gente reparti o pão da sabedoria em partes iguais!
Revista- E os vizinhos gostam da Cooperifa?
Sérgio Vaz- A o Entorno do bar não gosta muito, afinal está muito perto {risos}. Todo mundo quer ter uma feira no bairro, mas não na sua rua, mas o povo gosta sim, muitos participam.
Revista- A Cooperifa nunca recebeu apoio de nenhum órgão público?


Sérgio Vaz- Agora não mais, antes até vinham. A Gente tem um bom relacionamento com todo mundo, eles já entenderam qual é a da Cooperifa. A gente faz política sem ser partidária, acho que em outras atividades até pode ser, mas no sarau não, ele é intocável, é da comunidade.
Revista- A Cooperifa tem vários projetos entre eles: A Poesia no Ar, O Cinema na laje, A casa da ignorância, fala um pouco deles para gente.
Sérgio Vaz- Bom, o Poesia no ar, são poema colocados dentro de bexigas e que vento leva pela cidade, a gente chama de “atentados poéticos”. O cinema na laje é uma parceria da Cooperifa, e com a Pacus vídeos e o Zé Batidão exibindo basicamente documentários, por que o filme é uma boa forma de trazer cultura também. A casa da ignorância, a gente ainda não sabe direito que formato vai ter, mais vai ter teatro, disso eu sei!
Revista- Por que a Cooperifa não foi para o lado do esporte, não teria mais apego com o público?
Sérgio Vaz- Na verdade eu sou um cara do esporte, eu joguei na várzea, mas a atividade física só mexe com o corpo, e não com a mente, não traz cidadania e sim subserviência, não que isso acontece de propósito.
Revista- Como assim?
Sérgio Vaz- O esporte é da hora! Só que a gente quer literatura, ninguém passa incólume pela poesia, se você é jornalista e não lê, você vai ser um péssimo profissional. Quem comanda esse país lê, então deve ser interessante, a gente tem que criar esse hábito também! {risos}
Revista- Quais as principais dificuldades que o projeto enfrenta?
Sérgio Vaz- O povo não gosta de ler cara, é muito difícil tirar a pessoas da mediocridade. É muito gratificante quando as pessoas voltam a estudar por causa da Cooperifa. O incentivo a leitura não é uma coisa fácil, não é o estado somos nós mesmo.
Revista- E como mudar isso?
Sérgio Vaz- Os projetos são muito teóricos, propaganda de incentivo a leitura aquilo não instiga ninguém, só o cara que ganhou cachê para fazer, talvez nem ele.

Revista – A culpa então é do governo?
Sergio Vaz- Primeiro a gente precisa centralizar isso. Já me falaram que a gente precisa ter uma revolução armada, mas nós primeiro precisamos aprender a ler o manual de instrução. Não que eu seja a favor! As pessoas votam no Kassab {atual prefeito de São Paulo} e depois ficam perguntando o que ele esta fazendo lá. {risos}
 Revista- A gente não sabe ser democrático então?
Sérgio Vaz- A democracia não existe. Eu acho que ela significa acesso à cultura, educação, saúde e segurança. Você tem direito de ir e vir, aonde? Em Moema. Tem bairros que você não pode exercer esse direito, ou tu é parado pela policia ou pelo ladrão.
Revista- Como você definiria o Cooperifa hoje?
Sergio Vaz- É um movimento cultural da periferia para a comunidade, é isso!
Revista- Sérgio tem alguma coisa que nós deixamos perguntar e você gostaria de acrescentar?
Sérgio Vaz- Eu Gostaria de falar dos meus Sete livros que são: Subindo a ladeira Mar à noite, A margem do vento, Pensamentos vadios, A poesia dos Deuses inferiores, Colecionador de pedras, Cooperifa antropofagia periférica, Literatura pão e poesia.
Revista- Sérgio escolhe uma frase para encerrar a entrevista?
Sérgio Vaz- Não confunda briga com luta, a primeira tem hora e local para acabar, e a segunda continua a vida toda!










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