Entrevista com Sergio Vaz, criador do Cooperifa
Repartir
o pão da sabedoria
Foi com uma simples
ideia e um sonho de propagar a literatura na sua comunidade, que Sergio Vaz
criou o Sarau da Cooperifa, esse projeto ganhou corpo e quase 11 anos depois,
leva seus versos a muitos outros lugares
Fernando Santos
Todo menino sonha em ser
jogador de futebol, e com esse mineiro de 48 anos não foi diferente. Leitor
assíduo graças ao pai que tinha a leitura como hábito, o jovem rapaz foi
trocando aos poucos os campos de várzea pelas bibliotecas e a bola e pelos
livros, mais nunca deixando de lado o esporte que é sua grande paixão.
Casado há mais 15 anos, pai
de Mariana, Sergio Vaz recebeu a nossa revista em sua casa em Taboão da Serra
extremo sul de São Paulo, numa segunda-feira ensolarada, para uma conversa bem
descontraída. Com um grande sorriso no rosto, muito simpático, logo nos deixou
muito a vontade. Nosso primeiro contado com o poeta havia sido uma semana antes
no Sarau da Cooperifa, onde ele nos recebeu na porta e convidou toda a equipe
para participar do Evento.
Como dizia o poeta “Para
sobreviver o homem só precisa de alimento e sonhos”, é com esse intuito que
todas quartas- feiras acontece no bar do Zé Batidão os Saraus da Cooperifa. Em
um ambiente que mais parece uma garagem, algo em torno de 60 metros quadrados,
umas quinze mesas de plásticos espalhadas pelo local, ao centro um pedestal com
um microfone, e duas caixas de som uma de cada lado. Nesse recinto duas
centenas de pessoas se aglomeram para assistir o evento, homens, mulheres,
crianças, idoso, donas de casa, moradores de rua, enfim todos são bem vindos
pra expressar, suas angustias, medos, tristezas e alegrias, não importando se
tem rima, à plateia em silêncio acompanha as apresentações, numa verdadeira
troca de experiência e cultura.
Revista-
Sérgio fala um pouco de você, seus projetos e planos.
Sérgio Vaz- Mano, eu sou um cara que tenho 48
anos, sou casado, tenho uma filha chamada Mariana, moro em Taboão da Serra, sou
poeta, produtor cultural, e já escrevi sete livros.
Revista-
Como foi o seu primeiro contato com os livros?
Sérgio Vaz- Eu gosto de ler desde cedo,
por que meu pai gostava, aprendi com ele. Mas como todo garoto de periferia, eu
queria ser jogador de futebol, não deu certo, nunca imaginei ser poeta, o
trabalho da Cooperifa tem haver com isso, eu sempre pensei em fazer projetos,
na verdade eu queria que meus amigos gostassem de ler como eu. Assim a gente criaria
uma comunidade melhor.
Revista-
A cooperifa surge dessa ideia?
Sérgio Vaz- A Cooperifa foi criada por
mim e pelo Marco Pezão, e a ideia era basicamente propagar a literatura na periferia.
Revista-
E não tinha ninguém que falasse de poesia na periferia?
Sérgio Vaz- Sempre teve gente falando
de poesia na periferia, não fui eu que inventei isso. Não existia ninguém que
tivesse espaço, para falar de literatura, a Cooperifa ao menos tinha sede, era
em uma fábrica abandonada em Taboão da Serra.
|
Sérgio Vaz- Eu tinha um amigo que
fazia silk screens {é arte de colar estampa em camisa} em uma fabrica em Taboão
da Serra, um dia eu fui visitá-lo e vi o espaço e falei, Caramba! Dá para fazer
um monte de coisa aqui. E eu estava lendo algo sobre a semana de arte moderna
de 22 { foi um evento de arte que durou uma semana, e cada dia foi dedicado a
um tema: pintura, escultura, poesia, literatura e música, esse evento ocorreu
no Teatro Municipal} e foi com essa influência que a gente criou os primeiros
eventos da Cooperifa. Pena que logo
perdemos o local.
Revista-
Ai vocês chegaram ao bar do Zé Batidão?
Sérgio Vaz- Então o Pezão conseguiu um
bar em Taboão mesmo, e a gente ficou fazendo os Saraus lá, só que um e meio
depois perdemos o espaço também, aí eu falei para o Zé estamos mudando para cá,
e já era!
Revista-
Por que um bar?
Sergio Vaz- O bar é uma cultura da
periferia, assim como pipa, bolinha de gude, tudo acontece lá, a reunião do
time da várzea, é onde se guarda os instrumentos da escola de samba da
quebrada, é onde se discute se vai asfalta a rua, é a central de encontros da
comunidade, se você não for conhecido no buteco ninguém te acha.
Revista-
Os saraus acontecem as quartas- feiras, que é dia de futebol, é um jeito de
tentar desalienar as pessoas?
Sérgio Vaz- Não! No domingo é sagrado,
sexta e sábado tem balada, quinta-feira já começa o esquenta, então quarta-
feira é o dia. Não foi de propósito, mais só cola realmente quem gosta de
poesia.
Revista-
Que público vem prestigiar o evento?
Sérgio Vaz- O público é bem variado,
qualquer pessoa que é ligada a cultura quer conhecer o sarau da Cooperifa. Aqui
a gente tem um movimento de resistência, um evento que já acontece há onze
anos, sem música ou apoio do governo. Ali a gente reparti o pão da sabedoria em
partes iguais!
Revista-
E os vizinhos gostam da Cooperifa?
Sérgio Vaz- A o Entorno do bar não
gosta muito, afinal está muito perto {risos}. Todo mundo quer ter uma feira no
bairro, mas não na sua rua, mas o povo gosta sim, muitos participam.
Revista-
A Cooperifa nunca recebeu apoio de nenhum órgão público?
|
Revista-
A Cooperifa tem vários projetos entre eles: A Poesia no Ar, O Cinema na laje, A
casa da ignorância, fala um pouco deles para gente.
Sérgio Vaz- Bom, o Poesia no ar, são
poema colocados dentro de bexigas e que vento leva pela cidade, a gente chama
de “atentados poéticos”. O cinema na laje é uma parceria da Cooperifa, e com a
Pacus vídeos e o Zé Batidão exibindo basicamente documentários, por que o filme
é uma boa forma de trazer cultura também. A casa da ignorância, a gente ainda
não sabe direito que formato vai ter, mais vai ter teatro, disso eu sei!
Revista-
Por que a Cooperifa não foi para o lado do esporte, não teria mais apego com o
público?
Sérgio Vaz- Na verdade eu sou um cara
do esporte, eu joguei na várzea, mas a atividade física só mexe com o corpo, e
não com a mente, não traz cidadania e sim subserviência, não que isso acontece
de propósito.
Revista-
Como assim?
Sérgio Vaz- O esporte é da hora! Só
que a gente quer literatura, ninguém passa incólume pela poesia, se você é
jornalista e não lê, você vai ser um péssimo profissional. Quem comanda esse
país lê, então deve ser interessante, a gente tem que criar esse hábito também!
{risos}
Revista- Quais as
principais dificuldades que o projeto enfrenta?
Sérgio Vaz- O povo não gosta de ler
cara, é muito difícil tirar a pessoas da mediocridade. É muito gratificante
quando as pessoas voltam a estudar por causa da Cooperifa. O incentivo a
leitura não é uma coisa fácil, não é o estado somos nós mesmo.
Revista- E como mudar
isso?
Sérgio Vaz- Os projetos são muito
teóricos, propaganda de incentivo a leitura aquilo não instiga ninguém, só o
cara que ganhou cachê para fazer, talvez nem ele.
Sergio Vaz- Primeiro a gente precisa
centralizar isso. Já me falaram que a gente precisa ter uma revolução armada,
mas nós primeiro precisamos aprender a ler o manual de instrução. Não que eu
seja a favor! As pessoas votam no Kassab {atual prefeito de São Paulo} e depois
ficam perguntando o que ele esta fazendo lá. {risos}
Revista- A gente não sabe ser democrático
então?
Sérgio Vaz- A democracia não existe.
Eu acho que ela significa acesso à cultura, educação, saúde e segurança. Você
tem direito de ir e vir, aonde? Em Moema. Tem bairros que você não pode exercer
esse direito, ou tu é parado pela policia ou pelo ladrão.
Revista- Como você
definiria o Cooperifa hoje?
Sergio
Vaz- É um movimento cultural da periferia para a comunidade, é isso!
Revista- Sérgio tem
alguma coisa que nós deixamos perguntar e você gostaria de acrescentar?
Sérgio Vaz- Eu Gostaria de falar dos meus
Sete livros que são: Subindo a ladeira Mar à noite, A margem do vento,
Pensamentos vadios, A poesia dos Deuses inferiores, Colecionador de pedras,
Cooperifa antropofagia periférica, Literatura pão e poesia.
Revista-
Sérgio escolhe uma frase para encerrar a entrevista?
Sérgio Vaz- Não confunda briga com
luta, a primeira tem hora e local para acabar, e a segunda continua a vida
toda!
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